terça-feira, fevereiro 16, 2016

carinhoso

Besame mucho. Dai peguei a carona com o Pato. Vi um grupo correndo com uma lixeira que seria o carrinho do último bloco de terça. Já chego lá. Na praça XV, vejo a Mari de maio de ursinho. Muitos peitos e muitas bundas e muito led. Eu, de nerd. MAM em algum momento. Primeira travessia no aterro, que eu voltaria muitas vezes e que eu juro que é o lugar mais mágico e que toda vez que eu penso sair do Rio, eu penso nele à noite e toda aquela luz que pisca. Pisca. Pisca. Pisca. Roubam o meu pote de tinta neon. Acho escroto, mas muito adequado pro dia. Embaixo da língua pisca, pisca, pisca. Estou apaixonada nº 1. Depois saio correndo. Encontro minha amiga ficando com um francês, ela não tá entendendo nada. Nem eu. O dançarino contemporâneo que eu conheci na Bahia. O Rafa! A Luiza sumiu. Ainda é quinta-feira. A língua pisca mais. Estou apaixonada nº 7. Passando por pescadores dormindo e depois naquela parte mais escura do aterro. Essa é a parte que eu sempre tenho medo porque eu sempre to perdida nessa parte, essa parte tinha que ser no começo, não no meio porque ela é escura e no meio eu to sempre perdida no meio. A Luiza sumiu. A lua! A lua fina e vermelha. Eu e Maíra na areia por ela. Eu trabalho ainda amanhã. Viaduto do Belmonte. Esse bloco não acaba. Estou apaixonada nº 11. Fim do aterro. Achei a Luiza! Amiga! Te amo! Um táxi bate no outro. O dia escorre. Dai eu e Ian chegamos no Embaixadores. Uma equipe de jornalistas quer filmar o Ian que tá vestido daquele peixe que brilha. Eu to de Miss Colombia. A Luiza nem chegou e já sumiu, a Miss Filipinas. Estou apaixonada nº 16. Sei lá porque tá muito bom se é só marchinha. Mas tá muito bom. O Tarcísio! Vamos tirar foto com o Tarcísio! Tarcísio, você é foda. Foda! Luiza! Amiga! Te amo! Casa Nuvem. O Rafa alucina. O Ian alucina. Beijos, muitos beijos, menino, menina. Eu perco todo mundo. É o lugar mais quente do mundo. Acho a Ananda e o Lucas, a gente liga pra Mariana Gama. A gente acha um bloco que tá sendo levado por um morador de rua. Paramos. Jogamos altinha. Roça. Roça. Rua. Elevador. Sofá. Cama. Não para. Desce, mas não sobe. Tiro uma foto com a Ana com o rosto da Bella, que tá na Itália, em uma A4. Estou apaixonada nº 24. Perdida mais uma vez. Acho o Breno, perco a Luiza, acho a Lilia, perco o Lucas. Felicidade é o sacolé de cupuaçu do Barão. Entro na nóia de ter deixado limão cair no meu rosto e ficar pra sempre marcada. Nóia nº 5. O Nicolas pega meus óculos de “queria ser uma abelha pra pousar na sua flor”, apostamos que nos encontraremos mais 60.000 vezes. Depois, sendo sensatos, apostamos que nos encontraremos pelo menos 12.000 vezes. Tá uma merda o bloco já, mas vamos ficar. Até o Ian voltou. “Parei de transar, o negócio é chupar peito, chupa peitô, o esquerdo e o direto”. Gallego. Bia. Otávio. Joana. Chica. Lilia. Camila. Rafa. Cadê o Ian? Insolação. Encontro a Canallini no meio do caminho pra Gamboa. A Chica perde o chinelo no caminho pra Gamboa. Desculpe o transtorno no caminho pra Gamboa. Pequenas surpresas que aquecem o coração. Mania de sair entrando em tudo que é obra. Dançar na construção (de que). Levantar terra. Tentar arrancar placa. Chegando na Gamboa o bloco tava acabando de sair. Dá tempo de tomar uma Catuaba. Corre. Corre. Meio do bloco. Me perco da Luiza. A Mariana Lima! Estou apaixonada nº 43. Baile de Favela. O Henrique Diaz! Estou apaixonada nº 44. Odeio você nº 1. Essa porra dessa peruca loira que fica caindo. Será que o limão queimou meu rosto. Nóia nº 9. Vou subir nessa janela pra pegar um ar. Uma senhora me entrega um copo de água. A Ju e o Gabo me resgatam. Eu juro que quase beijei o Henrique Diaz, mas a corda nos empurrou pra longe.  O bloco na praça. Eu e Ian abrimos passagem pelo meio da obra da praça do coreto, uma multidão. Juro. Uma multidão. Uma multidão segue a gente. Somos os pioneiros daquela invasão. Estranhos orgulhos. Harmonia lotada. Eu encontro o Cezar que disse na primeira vez que conversamos que não ia há muito tempo num carnaval, não via muita graça, nem sentido. Eu disse pra ele que carnaval era também manifestação política, sair da calçada e ir pro meio da rua, entender onde se vive para poder questionar onde se vive, o que se vive e porque se vive. Zombar do que se vive. Ele entendeu pois. O Nicolas me devolve os óculos. Um cachorro quente com tudo dentro. 8h da manhã já estamos atrasados. Eu e Ian de “Bowie” tolo. “Se trata de ir de Bowie, mas se fazer de burro durante o bloco”. Novo trajeto do bloco. Falo com um grupo de policiais que a fantasia em grupo deles tá o luxo, só um sorri, e outro fala pra eu ir saindo rápido. Bandeira branca, amor. Subo num banco e vejo o bloco de longe. Passam 6 amores passados, passam 5 amores futuros, passam 8 amores de agora, beijo, língua, passa parte da minha infância, passa a Aurora triste, passa a galera do colégio que não falava comigo e agora fala, passa minha adolescência underground, passam 3 antigos professores, passa a minha ex-chefe, passam carnavais antigos, passa o Henrique Diaz, ainda são 10h da manhã. Esse boi tem a minha vida inteira. Vamos ficar na corda, não posso deixar ele passar. Nóia n° 12. Aqui tem a Luiza, o Ian, o João da Bahia, o Zé da Bahia, o Renan. Estou apaixonada nº 67. Completamente perdida. Apaixonada. Triste. Desesperada. Nóia nº 17. Sou a pessoa mais feliz arrasada realizada sem perspectivas intensamente feliz do mundo. Uma garota de jardineira espirra MD. O Fred Mercury canta em cima de um prédio. Love of my life, don’t leave me. O Ilan em cima do prédio. Fabian, você me achou! O Sasha de Chita. Sachita! A Aninha. Encontrar a Aninha acalma o coração, faz bem aos músculos. Caminho pro MAM. Na passarela, o coração já precipita muita coisa. Dois sacolés de mojito por 5 reais. Estou apaixonada nº 81. Pan Pan pan pan pan pan. Reverbera em cada gota de suor que tava dentro e agora cai e brotam novas gotas de suor. Eu to muito louca. Quero beijar cada um de vocês na boca. Estou apaixonada nº 99. Odeio você nº 15. Um gelinho na nuca. Mais uma vez navego de grupos em grupos. Tem a galera da xepa. A galera do carnaval passado. A minha galera tá ai no meio. Entramos meio a floresta do aterro. Mais uma vez aqui, de novo perdida no escuro, morro de medo e encontrar alguém é como entrar durante alguns segundos no útero materno da cumplicidade e afeição que só o carnaval oferece e é também por isso que eu acredito tanto e tanto nele. Mas assim como tudo deve ser por mil motivos a gente se perde de novo e se encontra mais na frente. Abraços reservados para todos encontros e reencontros. A Laura e o Gregório tentam me segurar. Depois o Pedro, com a língua. Depois a Aninha com o Rubel. O Bruno com a Caetana. A Clarinha com a Antônia. Lembro que não comi nada o dia inteiro. Rafa! Rafa! Choramos alguma coisa juntos, damos um abraço apertado. Hugo chega e lembra da fome. Um cachorro quente com tudo dentro. Seguir ou não seguir com o bloco, eis a questão. Uma torção no pé é detectada. Voltamos mancando. A descoberta preciosa de um produto chamado Biofenac. Ainda bem que o dia seguinte começa mais tarde. Vestida de “essa barra que é gostar de você”, esqueço a barra em casa e só parece que sou esportista. Atleeeeeta de carnaval, grita alguém no ônibus. Eu ainda manco de ontem. Desisto de explicar que na verdade to “de barra que é gostar de você”, mas sem barra. Mais fácil andar correndo de costas noventa vezes o centro da cidade inteiro, pulando obras e me equilibrando nos trilhos incompletos do VLT, do que gostar de você, caralho. Caralho. Nunca foi tão difícil. Ou já, mas tá uma merda, vai se foder. Odeio você pra caralho nº 18. Essa época do ano tudo reverbera e arde e passa. Passou. Encontro a Gabi com aquele colírio que pinga na língua. Depois o Lucão, também de atleeeta do carnaval. Saímos correndo e fazendo alongamentos. Bruno e Giuseppe vestidos das gêmeas do iluminado. Tiramos uma foto pra posteridade. Eu queria ser uma abelha pra pousar na sua flor. Haja amor! Haja amor! Ian e eu começamos a rebolar e a bater nos nossos bumbuns e fazer caretas entre os carros.“Parei de transar, o negócio é chupar peito, chupa peitô, o esquerdo e o direto”. Um bloco em segredo sairá em breve. Mas dá tempo para mais um mergulho pra dentro do MAM. Dou a mão pro Fabian e saímos atravessando por baixo dessa vez. Uma menina de cabelo rosa nos dá doses de cachaça de banana. Valeu à pena ê ê. Valeu à pena ê ê. Sou pescador de ilusões. Essa era a descrição do flogão quando eu tinha 11 anos, danço do lado de um antigo crush do ensino médio que continua metido a gostosão. A vida em looping. Tudo ganha novo significado. A moita em cima de um estacionamento abandonado (?) no centro. Baile de Favela. Daqui não saio, daqui ninguém me tira. Ápice de felicidade da minha vida. Disseram que eu andei pelas obras correndo. Encontro o João Vicente com a Nayana. Ruas muito parecidas no centro. Que bloco! Estou apaixonada nº 112. No meio das obras desse centro, estou completamente apaixonada. Eu encontro o Pedro e nós desabafamos dores e amores. Estou perdida mais uma vez. Beijo o primeiro desconhecido. Trocamos telefone? Uma mensagem no dia seguinte alertaria que sim, ou foi um dia antes a mensagem? Reencontro o Ian, perdido do Breno, sentado naquelas escadinhas atrás do IFCs. Me afundo no colo dele e ele no meu e entendo a profundidade assustadora de uma relação de amor em meio a tanta loucura. Entendo a vida e a morte. Toda a importância, eu entendo. Num abraço, esqueço de mim, das guerras, das contas, do fim do carnaval e de tudo. Falamos sobre o carrossel ou furacão ou montanha-russa de emoções que se vive nesses dias. Nunca fui tão feliz com tão pouco e nem tão miseravelmente triste. Só sei que acredito piamente no que estamos fazendo por essas ruas. Não quero sair daqui. Eu vou ficar! Eu vou ficar! Vejo alguém beijando alguém que eu não gostaria que alguém beijasse. Resolvo comer um cachorro quente de forno. Odeio você nº 25. Baile de favela. Não pode parar. Do nada to no meio de um bloco de fanfarra, correndo entre seres de led pelas ruas largas do centro. Muitas bundas, peitos e brilhos. A onda é correr e led e Techno. Muitos peitos e bundas, graças à Deus. Encontro o Breno que tinha sumido. Esbarro na Luiza! Amiga! Te amo! Correr. Subir em cima das coisas. Capô de caminhonete. Ferros das obras. Subir no caminhão. Se jogar lá de cima, confiando no maluco que diz que vai fazer pezinho. Cair. Cair em cima do maluco. Perder a chave. Continuar a correr. Gastar onda. Dança correndo. Rafahugosauloandrélauraianbrenobrunogiuseppe. Estou apaixonada nº 131. Dança esquisito. Baile de favela. Ficar sozinho dá caô. Beijo à três no João e no Snape. Quase morrer no fim de alguma rua com Fabian e Luiza até sermos engolidos pelos amigos da onça raw raw. Só sei que o dia amanhece em algum momento e nós estamos na escadaria. Eu durmo com a cabeça encostada num desconhecido muito simpático, que oferece seu ombro pra um fim de resistência. Na terça à tarde, sai um bloco pequeno e que se diz sem banda no meio de uma ladeira da glória. Simples e lindo como um samba de Noel. Reencontramos a menina de cabelo rosa com outra cachaça, descubro que ela é generosa sempre e se chama Hêlo. Estou apaixonada nº 146. No caminho entre esse e o bloco mais misterioso do carnaval - aquele cujo o carrinho de comissão de frente era o carrinho de lixo do começo de tudo, talvez do universo, lá na quinta - parte do meu dedo fica pro santo. O sangue marca o caminho. Bar do Peixe II. O bloco já saiu. Saímos juntando mais gente ao grupo até achar. Peregrinação próxima a cruz vermelha. Em meio ao calor do fim do centro, o bloco sem marchinha e com poucos músicos sai. Reconhecemos pelo Pikachu amarelo que saltita lá na frente. Num recorde de trinta segundos, me perco da Luiza. A frase “Pela precarização do carnaval” é segurada por uma caveira de braços abertos. É isso! O percurso é áspero e o meu dedo ainda sangra. Brinco de me equilibrar nos trilhos com uma amiga da Ana. A Maíra me puxa pra corda. Respirar é preciso. Baile de favela. A Maíra vai embora. Sozinha mais uma vez. Até que tem o Rafa e o Hugo. Depois tem o Freitas, o Arthur e o Milecco. “Parei de transar, o negócio é chupar peito, chupa peitô, o esquerdo e o direto”. Descubro a mágica de tomar uma skoll beats verde. Aproximando do Museu do Amanhã, alguém grita: vai ter que invadir! Ou fui eu quem gritei? Um maluco que começa a bambar com a primeira barra de ferro de inúmeras delas em fileiras e mais fileiras que separam o povo das portas do museu. A segunda barra de ferro sou eu quem derruba e, assim, em pouco menos de quinze minutos tamos embaixo do amanhã, que vai ser outro dia. Ou agora. Aqui. No meio do carnaval, manda quem pode, ocupa quem tem vontade. Vamos ocupar! O Matisse me joga aquela água nojenta da piscina - cheia de gente - que envolve o museu. Inesquecível. Estou apaixonada nº 169. Converso com o Felipe Ridolfi sentada numa escadinha que devo estar com febre. Estou sem chave, sem a metade do dedo, acabei de dar um beijo num menino que decorei o sobrenome como Peixe em inglês ou Vera, Fischer, meu dinheiro está chegando ao fim, assim como minha voz, meu pé tá inchado, baile de favela, meu celular descarregado, ainda to segurando aquela skoll beats verde até agora. Ou já é outra? O Freitas me resgata. Uma quarta de febre, manca e em posição fetal. Tristeza por favor vá embora, viciei em carnaval. E provavelmente em outras substâncias. Mas mais em carnaval. Suadouro. O último bloco. O fim da temporada de marchinhas. E a estrela dalva porque estás tão triste se você fosse sincera eu posso me regenerar ai meu bem não faz assim comigo não atravessando o deserto do Saara. Definitivamente cachaça não é água e pode até faltar o amor, menos cachaça. Finalmente encontro o Flores. Declaro a Luiza que a amo e que a melhor coisa é perder pra encontrar com ela no meio do bloco. Até que a polícia chega, spray de pimenta na cara, sem nem entender direito e depois de entender e começar a xingar mais spray de pimenta. O Fabian me salva. “Não acabou! Tem que acabar! Eu quero o fim da polícia militar!”. Beijo o Vitor. Subo num portão com a Luiza. Peço água numa casa e um cara me dá uma garrafa de 2 litros, que divido com Otávio, Thiago e Chica. Os mesmos de segunda-feira. Eu ainda a mesma, mas completamente outra. Me perco depois de uma ducha de mangueira. Mangueira! Subo em cima do capô do carro e canto com o peito estufado: “Meu coração não sei porque bate feliz quando de te vê.”. A banda para na Monte Alegre. As vozes em coro. Duas velhas na janela. Uma criança nos ombros do pai. A vida é enorme. O bloco é maior. Muitos dos meus velhos e novos e futuros amores passando por ali naquele instante, meus amigos, todas as substâncias que circulam no meu sangue, todos os lugares que me perdi em neon. O carnaval é essa potência do tosco, do simples, do conjunto, do afeto, da aceitação e do seguir, seguir sempre, sem pensar muito e somente deixar ir e ser. Os meus olhos ficam sorrindo e pelas ruas vão te seguindo.